Absorção cutânea e nasal de agentes tóxicos

Com este artigo pretendemos mostrar como é feita a absorção cutânea e absorção nasal dos agentes tóxicos. Iremos começar com a absorção cutânea.

Absorção Cutânea

A pele íntegra é uma barreira efetiva contra a penetração de substâncias químicas exógenas. No entanto, alguns xenobióticos podem sofrer absorção cutânea, dependendo de fatores tais como a anatomia e as propriedades fisiológicas da pele e propriedades físico-químicas dos agentes.

A pele é formada por duas camadas, a saber: epiderme e derme. A epiderme, que é a camada mais externa da pele é constituída por cinco regiões distintas:

  • região córnea: possui duas sub-camadas, o extrato córneo descontínuo (mais superficial) e o extrato córneo contínuo. Esta região é constituída de células biologicamente inativas, que são continuamente renovadas (geralmente a cada 2 semanas no adulto), sendo substituídas por células provenientes das regiões mais profundas da epiderme. Durante esta migração para a superfície, as células sofrem um processo de desidratação e de polimerização do material intracelular, que resulta na queratinização celular, ou seja, na formação de proteína filamentosa denominada queratina.
  • região gordurosa: é constituída de lípides provenientes, principalmente, da ruptura de lipoproteínas durante o processo de queratinização.
  • região lúcida: constituída de células vivas em fase inicial de queratinização.
  • região germinativa: local onde ocorre a formação das células da epiderme e também da melanina.
  • a derme, que é formada por tecido conjuntivo, pode-se observar a presença de vasos sangüíneos, nervos, folículos pilosos, glândulas sebáceas e sudoríparas. Estes três últimos elementos da derme permitem o contato direto com o meio externo, embora não existem dados que demonstrem haver absorção através das glândulas citadas.

As substâncias químicas podem ser absorvidas, principalmente, através das células epidérmicas ou folículos pilosos:

Absorção transepidérmica:

A absorção dos agentes químicos pela pele tem sua velocidade limitada pela região córnea da epiderme, mais precisamente pelo extrato córneo contínuo. As substâncias lipossolúveis penetram por difusão passiva através dos lípides existentes entre os filamentos de queratina, sendo a velocidade desta absorção indiretamente proporcional à viscosidade e volatilidade do agente. Já as substâncias polares, de baixo peso molecular, penetram através da superfície externa do filamento de queratina, no extrato hidratado. A absorção transepidérmica é o tipo de absorção cutânea mais freqüente, devido ao elevado número de células epidérmicas existente, embora não seja uma penetração muito fácil para os AT.

Absorção transfolicular:

O número de folículos pilosos varia de 40 a 800 por cm2, o que representa apenas 0,1 a 1% da superfície total da pele. Sendo assim, esta absorção não é tão significativa quanto a transepidérmica. Algumas substâncias químicas podem penetrar pelos folículos pilosos, alcançando rapidamente a derme. É uma penetração fácil para os agentes químicos, uma vez que eles não necessitam cruzar a região córnea. Qualquer tipo de substância química, seja ela lipo ou hidrossolúvel, ionizada ou não, gás ou vapor, ácida ou básica, pode penetrar pelos folículos. É uma absorção também importante para alguns metais.

Fatores que influem na absorção cutânea

São vários os fatores que podem influir na absorção através da pele. Geralmente eles são agrupados em quatro classes diferentes:

Fatores ligados ao organismo

  • Superfície corpórea: a superfície corpórea total no homem é maior do que na mulher (média de 1,70 a 1,77 m2 no  homem e de 1,64 a 1,73 m2 na mulher). Este fato pode aumentar a absorção transepidérmica no homem (maior superfície de contato com o xenobiótico).
  • Volume total de água corpórea: Quanto maior o volume aquoso corpóreo, maior a hidratação da pele e consequentemente, a absorção pela pele. Quando comparado à mulher, o homem possui maior volume aquoso total, extra e intracelular o que favoreceria a absorção cutânea. Este fato deve ser considerado, também, quando se compara mulheres grávidas e não grávidas. As gestantes apresentam maior volume aquoso corpóreo e, em conseqüência, maior hidratação do extrato córneo. Isto possibilita maior absorção cutânea de xenobióticos.
  • Abrasão da pele: com a descontinuidade da pele, a penetração torna-se fácil;
  • Fluxo sangüíneo através da peIe: estudos demonstram que, em média, 5% do sangue bombeado pelo coração passa pela pele, em um fluxo em torno de 120 mL/kg/min. Inflamação ou fatores que levam à hiperemia aumentarão a absorção cutânea. Um fato a ser considerado é a gravidez. Durante a gestação ocorre alterações significativas no fluxo sangüíneo das mãos (aumentam 6 vezes) e pés (aumentam 2 vezes). Esse aumento no fluxo sangüíneo poderá influir na absorção cutânea de xenobióticos nas gestantes expostas. Não foi detectada diferença entre o fluxo sangüíneo cutâneo de homens e mulheres não gestantes. Um fator a ser considerado é a vascularização das áreas expostas, uma vez que, quanto mais vascularizada a região, maior o fluxo sangüíneo no local.
  • Queimaduras químicas e/ou térmicas: apenas as leves ou moderadas, já que as severas destroem totalmente o tecido, formando uma crosta de difícil penetração;
  • Pilosidade: nas áreas em que existem pêlos, a absorção cutânea pode ser 3,5 a 13 vezes maior do que nas regiões glabras;

Fatores ligados ao agente químico

  • Volatilidade e viscosidade;
  • Grau de ionização;
  • Tamanho molecular.

Fatores ligados à presença de outras substâncias na pele

  • Vasoconstritores: estes vão reduzir a absorção cutânea, devido à diminuição da circulação sanguínea.
  • Veículos: podem auxiliar na absorção, mas não promovem a penetração de substâncias que, normalmente, não seriam absorvidas pela pele íntegra. Alguns veículos podem, também, absorver o ar de dentro dos folículos e da mesma maneira aumentar a absorção transfolicular.
  • Água: a pele tem normalmente 90 g de água por grama de tecido seco. Isto faz com que a sua permeabilidade seja 10 vezes maior do que  aquela do extrato totalmente seco. O contato prolongado com água pode aumentar a hidratação da pele em 3 a 5 vezes, o que resultará em um aumento na permeabilidade cutânea em até 3 vezes.
  • Agentes tenso-ativos: os sabões e detergentes são substâncias bastante nocivas para a pele. Eles provocam alteração na permeabilidade cutânea, mesmo quando presentes em pequenas concentrações. Alteram principalmente a absorção de substâncias hidrossolúveis, devido a modificações que provocam na estrutura do filamento de queratina. Estes agentes tensoativos se ligam à queratina e com isto provocam a sua reversão de a para b hélice.
  • Solventes orgânicos: estes aumentam a absorção cutânea para qualquer tipo de agente químicos, pois removem lípides e lipoproteínas presentes no extrato córneo, tornando-o poroso e menos seletivo. Os solventes mais nocivos são aqueles com características hidro e lipossolúveis. Destaca-se, como um dos mais nocivos, a mistura clorofórmio: metanol (2:1).

Fatores ligados às condições de trabalho (quando se tratar de exposição ocupacional)

  • tempo de exposição;
  • temperatura do local de trabalho: pode haver um aumento de 1,4 a 3 vezes na velocidade de penetração cutânea de agentes químicos, para cada 10oC de aumento na temperatura.
  • Como citado anteriormente, o sexo e o estado gestacional podem alterar parâmetros fisiológicos importantes e, consequentemente, a intensidade da absorção cutânea.

Ação dos agentes tóxicos sobre a pele

No contato dos agentes químicos com a pele podem ocorrer:

  • Efeito nocivo local sem ocorrer absorção cutânea. Ex.: ácidos e bases fortes.
  • Efeito nocivo local e sistêmico. Ex.: o arsênio, benzeno, etc.
  • Efeito nocivo sistêmico, sem causar danos no local de absorção: é o caso, por exemplo, dos inseticidas carbamatos (exceção feita ao Temik que é um carbamato com potente ação local).

Absorção nasal

A via respiratória é a via de maior importância para Toxicologia Ocupacional. A grande maioria das intoxicações ocupacionais é decorrente da aspiração de substâncias contidas no ar ambiental. A superfície pulmonar total é de aproximadamente 90 m2, a superfície alveolar de 50 a 100 m2 e o total de área capilar é cerca de 140 m2. O fluxo sangüíneo contínuo exerce uma ação de dissolução muito boa e muitos agentes químicos podem ser absorvidos rapidamente a partir dos pulmões. Os agentes passíveis de sofrerem absorção pulmonar são os gases e vapores e os aerodispersóides. Estas substâncias poderão sofrer absorção, tanto nas vias aéreas superiores, quanto nos alvéolos.

Gases e Vapores

Geralmente não é dada muita atenção para a absorção destes compostos nas vias aéreas superiores. Deve-se considerar, no entanto, que muitas vezes a substância pode ser absorvida na mucosa nasal, evitando sua penetração até os alvéolos.

A retenção parcial ou total dos agentes no trato respiratório superior, está ligada à hidrossolubilidade da substância. Quanto maior a sua solubilidade em água, maior será a tendência de ser retido no local.

Visto sob este ângulo, a umidade constante das mucosas que revestem estas vias, constitui um fator favorável. Há, no entanto, a possibilidade da ocorrência de hidrólise química, originando compostos nocivos, tanto para as vias aéreas superiores quanto para os alvéolos. Ex.: tricloreto de fósforo + H2O  ®  HCl  + CO2; dióxido de enxofre (SO2) + H2O  ® ® ® ácido sulfúrico.

Isto é importante porque estes produtos formados, além dos efeitos irritantes, favorecem também a absorção deles ou de outros agentes pela mucosa já lesada. Assim, nem sempre, a retenção de gases e vapores nas vias aéreas superiores é sinônimo de proteção contra eventuais efeitos tóxicos.

Nos alvéolos pulmonares duas fases estão em contato: uma gasosa formada pelo ar alveolar e outra líquida representada pelo sangue.

As 2 fases são separadas por uma barreira dupla: o epitélio alveolar e o endotélio capilar. Diante de um gás ou de um vapor, o sangue pode se comportar de duas maneiras diferentes: como um veículo inerte, ou como meio reativo.

Em outras palavras, o agente tóxico pode dissolver-se simplesmente por um processo físico ou, ao contrário, combinar-se quimicamente com elementos do sangue. No primeiro caso tem-se a dissolução do AT no sangue e no segundo caso a reação química.

Continuar para próximo artigo: Dissolução do agente tóxico no sangue

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